As contas eleitorais

Não há democracia madura sem um processo eleitoral transparente e confiável. Tem sido esta a tendência demonstrada com o endurecimento nas regras impostas para a prestação de contas eleitorais, nos últimos pleitos.

E os rigores parecem aumentar ainda mais quando três “pesos pesados” se unem em torno desta questão. Pela lisura eleitoral têm trabalhado em uníssono o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) e o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB).

Um comemorado consórcio a partir do qual foi gestada a Resolução nº 23.406/2014 em que o TSE apresentou inovações que deverão nortear a arrecadação de recursos de campanha, a destinação dos gastos e a forma de prestar contas, com o objetivo de coibir ilícitos e reduzir possíveis diferenças provocadas pelo exagerado uso do poder econômico.

Agora, a prestação de contas só será validada se tiver sido “contabilizada” por profissional da contabilidade que, ao final, assina em conjunto com o candidato. Como fazem os Fiscos há anos, os Tribunais Regionais Eleitorais poderão experimentar grande economia de trabalho, que só é possível quando alguém vocacionado a prestar contas se responsabiliza pelo processo.

Igualmente acertado, a partir de então, candidatos e partidos deverão constituir advogados para que os representem judicialmente nos processos de prestação de contas partidárias e de campanha, cujo exame por parte do Estado assume caráter jurisdicional.

Todavia, talvez mereça atenção e cuidado um dispositivo na norma que prevê quebra de sigilo bancário e fiscal de candidatos, partidos, doadores e fornecedores, na hipótese de “indício” de ilegalidade. Parece claro o caráter abusivo de tal premissa uma vez que relativizar um direito fundamental, não contribui em nada para a construção de um Estado Democrático de Direito.

No geral, entretanto, combinadas à Lei “Ficha Limpa” (Lei complementar nº 135/2010), as ferramentas de fiscalização e controle do processo eleitoral brasileiro se aperfeiçoaram, ganhando contornos de credibilidade com a honrosa participação de contadores e advogados.

Mas, apesar de tudo isso, para avançar, o Brasil ainda continuará dependendo da consciência do eleitor na hora voto, cuja tarefa será garimpar um representante que tenha conseguido se destacar, imune às repugnantes práticas eleitorais que ainda vigoram neste país.

* Haroldo Santos Filho é advogado e contador.

** Artigo de opinião publicado no jornal “A Gazeta”, em 30 de julho de 2014

Artigo_HSF_Contas_Eleitorais_A_Gazeta_30_07_2014

 

Democracia, pesquisa e voto

Parece que foi ontem que brasileiros idealizadores de um país livre e democrático, em guerra contra o poder, pagaram o preço da mudança. Hoje, graças a isso, podemos celebrar a cada dois anos, a festa da democracia, ao escolhermos nossos representantes do executivo e do legislativo, sob os olhos atentos de uma imprensa livre.

Nossa democracia, no entanto, parece viver o desconforto do limbo. Não tem mais o cheiro e a inocência de um recém-nascido, mas também não apresenta a necessária maturidade, deixando à mostra fragilidades viscerais. Dos vários vilões que contribuem para isso, ocupam destaque a nefasta desigualdade socioeconômica e o analfabetismo funcional de boa parte de nosso povo. Com eles, não há democracia saudável.

Esta peculiar realidade é que deveria pautar as pesquisas de intenção de voto, sob pena de acabarem protagonizando resultados, ao invés de apenas medi-los. É o famigerado voto útil que pode, sem dúvida, induzir incautos a trilhar pelo caminho apontado como mais próximo de vencer. Afinal, para muitos, teria algo mais terrível do que “perder” o seu voto?

Desde 1945, quando o Brasil viu a sua primeira pesquisa eleitoral publicada (IBOPE), nunca, este instrumento foi tão utilizado como ferramenta de marketing político e norteador de apoios, coligações e interesses partidários como presenciamos nos dias atuais. Um ótimo motivo para que se regulamentem as técnicas empregadas nas pesquisas de opinião em nosso país.

A importância e a utilidade de uma pesquisa publicada na mídia justificam, por si só, que ela tenha características científicas, cuja metodologia possa afastar construções interpretativas comprometedoras de uma pacífica escolha cidadã. Aí merecem especial atenção as altas e inconcebíveis margens de erro (4%) e a escolha não aleatória das amostras. A quinze dias de um pleito, por exemplo, também deveria ser proibida a publicação de pesquisas com margem de erro superior a 1%. Aumento de custos? Quem disse que zelar pela democracia é barato?

Trata-se de uma excepcional oportunidade para que institutos de transparência independentes possam chamar para si a responsabilidade de gerarem pesquisas eleitorais científicas e inquestionáveis. O atual momento brasileiro é especial e uma rara oportunidade para avançarmos, deixando para trás ranços que ainda seguram o crescimento desta nação.

* Artigo de opinião publicado no jornal “A Gazeta”, em 08 de novembro de 2012